Demanda em ascensão

Oferta de elevador de cremalheira pode se tornar gargalo após 2015, quando a NBR 16.200 vai apertar as exigências de segurança e dificultar o uso do elevador a cabo

Por Gisele C. Cichinelli

Revista Construção Mercado – PINI – Edição 145 – Maio/2013
Os elevadores de cremalheira são tradicionalmente reconhecidos pela segurança e alta produtividade no transporte de cargas e pessoas dentro dos canteiros. Apesar do custo mais alto que o dos elevadores a cabo, o uso do elevador de cremalheira tem se tornado cada vez mais frequente nas obras brasileiras e, a julgar pelo cenário previsto para os próximos dois anos, a expansão deve continuar.

A partir de 2015, tantos os elevadores a cabo quanto os de cremalheira produzidos no País deverão atender aos quesitos de fabricação da nova norma NBR 16.200 – Elevadores de Canteiros de Obras para Pessoas e Materiais com Cabina Guiada Verticalmente – Requisitos de Segurança para Construção e Instalação. O texto, publicado em abril de 2013, não proíbe o uso dos elevadores a cabo nas obras, mas as alterações necessárias para que esses equipamentos atendam aos requisitos são tão profundas que algumas empresas já sinalizam que podem interromper a produção. “Esses elevadores [a cabo] serão tão diferentes com a norma, que praticamente se trata de outro produto, com custo de produção quase igual ao dos elevadores de cremalheira. Nós não vamos mais fabricá-lo”, antecipa Marcelo Lima, diretor comercial da Metax.

A consequência esperada será o aumento da procura pelos elevadores de cremalheira. Absorver essa demanda emergente, no entanto, poderá ser um gargalo para os fabricantes. “Sinceramente não acredito que os fornecedores estejam preparados para essa procura. Apesar de já termos uma data para que as normas sejam atendidas, tenho medo de que os elevadores sejam substituídos apenas quando o prazo se encerrar”, alerta Carlos Eduardo Viégas Alves, engenheiro da área de suporte técnico da Mecan. “Na hora em que definitivamente o Ministério do Trabalho proibir os antigos elevadores a cabo, acredito que teremos sérios problemas.”

Alves estima que existam, atualmente, cerca de seis mil elevadores a cabo instalados e em operação, ou seja, seis mil equipamentos com potencial para serem substituídos pelos cremalheiras. “Atender a essa demanda de uma hora para outra não será fácil.” A importação de equipamentos, tal como aconteceu em 2010, quando o ritmo das obras era intenso, pode ser uma alternativa, mas especialistas alertam para o risco de faltarem peças para reposição, equipes qualificadas para fazer a manutenção e de se adquirirem máquinas não adequadas à nova norma.

Dimensionamento
Atualmente, o mercado brasileiro oferece elevadores de cremalheira com capacidade de carga que varia de 800 kg a 2 mil kg, e velocidade que vai de 35 m/min a 66 m/min. Para que as vantagens do equipamento sejam aproveitadas na obra, no entanto, é fundamental dimensioná-lo corretamente. A escolha do modelo ideal deve considerar o volume de insumos a serem transportados por serviço, a capacidade do equipamento (carga e velocidade) e o tempo de transporte e descarga por pavimento. A opção pelo modelo de cabina dupla – com duas plataformas independentes correndo em lados opostos de uma mesma torre – pode ser vantajosa nas situações em que o volume de trabalho e a altura do prédio forem maiores (preferencialmente acima de seis andares).

A contratação por aluguel é a prática mais comum. Além de evitar problemas com armazenamento, essa modalidade garante a manutenção do equipamento, realizado por equipes especializadas, o que diminui consideravelmente o risco de acidentes nos canteiros.

Na hora de contratar, a construtora deve exigir a Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) da montagem e do equipamento e atentar para as normas de segurança. Em regiões litorâneas, é recomendado que os equipamentos sejam contratados com torres maciças ou galvanizadas para diminuir os efeitos da corrosão. Por último, deve-se verificar se a empresa fornece assistência técnica na cidade em que será instalado o elevador e se o acesso às peças de reposição é fácil e rápido.

ENTREVISTA – ANTONIO PEREIRA DO NASCIMENTO

Elevadores mais seguros

Quais as principais mudanças previstas na NBR 16.200 e quais seus impactos no setor?
Os elevadores a cabo tais como são fabricados hoje sairão do mercado. O elevador a cabo será praticamente um novo produto, que trabalhará com outro conjunto de cabos, sistemas de tambores duplos etc. Será mais parecido com um elevador definitivo, que raramente sofre quedas. O elevador a cabo está há mais tempo no mercado e apresenta uma incidência maior de acidentes. A tecnologia do cremalheira é mais sofisticada, mas mesmo esses equipamentos precisarão ser readequados.

Há dados sobre a diminuição do número de acidentes desde que os elevadores de cremalheira passaram a ser mais usados?
Na cidade de São Paulo, o último acidente fatal com elevadores a cabo aconteceu há cinco anos. Tivemos um acidente com a morte de um montador em Barueri (SP) com elevador de cremalheira. Ou seja, a situação está melhorando.

Quais são as medidas de segurança indicadas para a instalação e operação dos elevadores de cremalheira?
É preciso contar com um manual de operação e manutenção em português e com um programa de manutenção preventiva eficaz. A escolha do fornecedor deve levar em conta a existência de engenheiros mecânicos, com registro no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea), que atuem como responsáveis técnicos pelos equipamentos. Também é importante contar com trabalhadores treinados e capacitados para atuarem como montadores e mecânicos de manutenção.

E no canteiro, especificamente?
Na obra, o ideal é contar com equipamentos que ofereçam dois freios motores – que trabalham com sistema de isolamento de carga e de pessoas quando o transporte for simultâneo – e com limites elétricos inferiores e superiores bem definidos e eficazes. As cancelas precisam apresentar um bom controle de abertura, evitando riscos de queda. É importante que o sistema de frenagem de segurança seja testado a cada 90 dias. Por último, cabe ressaltar que o operador deve ser capacitado em curso de 16 horas e passar por reciclagem anual.

`Os elevadores a cabo tais como são fabricados hoje sairão do mercado. O elevador a cabo será praticamente um novo produto, que trabalhará com outro conjunto de cabos`
Antonio Pereira do Nascimento, auditor fiscal do trabalho da Delegacia Regional do Trabalho do Estado de São Paulo

NORMAS TÉCNICAS

 NR-18 – Condições e Meio Ambiente de Trabalho na Indústria da Construção
 NBR 16.200 – Elevadores de Canteiros de Obras para Pessoas e Materiais com Cabina Guiada Verticalmente – Requisitos de Segurança para Construção e Instalação

Mesa-redonda

Antonio Freire, engenheiro técnico de vendas do departamento comercial da Fast Transportes Verticais

Carlos Cristofani, coordenador de segurança da MPD

Carlos Eduardo Viégas Alves, engenheiro da área de suporte técnico da Mecan

Felipe Germano Morasco, engenheiro da Produtime Gestão e Tecnologia

José Roberto Leite, gerente de incorporação da BKO

Marcelo Lima, diretor comercial da Metax

Raffael Törö, gerente de marketing da Montarte

Willian Rosa, engenheiro do Grupo Baram

Francisco Gomes, engenheiro do Grupo Baram

Como tem sido o desempenho do mercado de elevadores de cremalheira nos últimos anos?
CARLOS EDUARDO VIÉGAS ALVES – Desde 1998, quando começamos a trabalhar com cremalheira, o uso era bem concentrado na cidade de São Paulo. Nos últimos cinco anos, porém, a utilização se expandiu pelo Brasil inteiro. Existe o mercado locador e o comprador. No Nordeste, as construtoras preferem comprar; já em Porto Alegre, por exemplo, é muito comum a locação desses equipamentos.
FRANCISCO GOMES – Acabamos de entrar com o cremalheira no Estado de São Paulo. É um produto novo para a empresa. Por enquanto, percebemos que o mercado tem absorvido o cremalheira muito mais por meio de locação do que de comercialização.

Como estão divididos os mercados de compra e locação, em média, no País?
ALVES – Hoje, há espaço para ambas as modalidades, tanto para locação quanto para venda. A escolha por uma modalidade ou outra depende dos perfis regionais e da própria construtora. Algumas empresas conduzem muitas edificações diferentes ao mesmo tempo e preferem adquirir o próprio equipamento.
WILLIAN ROSA – Cada região tem uma característica diferente. A disponibilidade de locação no mercado é importante, porque muitas vezes a empresa acaba comprando o equipamento por falta de opção de locação.
FELIPE GERMANO MORASCO – No começo de 2013, o Finame [Financiamento de longo prazo para aquisição e produção de máquinas e equipamentos novos, de fabricação nacional, cadastrados na Agência Especial de Financiamento Industrial] estava com taxas de juros muito baixas e muitas empresas ficaram tentadas a comprar diversos equipamentos. Mas quando ponderaram toda a mobilização envolvida, necessidade de montagem e desmontagem, manutenção e armazenagem, muitas acabaram recuando dessa ideia.

A compra envolve essa necessidade de manutenção, armazenagem e ritmo de obra que justifique o uso do equipamento em sequência. Mesmo assim há ainda empresas que optam pela aquisição?
ALVES – Algumas chegam à conclusão de que, com muitas obras em andamento, compensa mais a compra. Essas empresas possuem até mesmo uma central para manutenção do equipamento. Vale ressaltar que, assim como o locador nunca pensa em ter o material todo no pátio, as construtoras que adquirem os equipamentos também querem vê-los girando em suas obras. Quem compra não pretende deixar o cremalheira parado.
GOMES – No Estado de São Paulo, por conta da necessidade de mão de obra capacitada, da manutenção preventiva e de montagem e desmontagem, as empresas preferem locar e contratar esses serviços, pois eliminam problemas. Uma locadora que trabalha no segmento pode assumir todas essas responsabilidades.
CARLOS CRISTOFANI – Exato, quando optamos pela locação, é a locadora que acaba assumindo a responsabilidade total pelo equipamento.
ALVES – No nosso caso, não fazemos a locação para a construtora se não fecharmos o contrato de manutenção também. Já no caso da venda, não é possível obrigar a contratação desse serviço.

Que avaliação vocês fazem dos equipamentos que estão vindo de fora do Brasil? Estão de acordo com as normas brasileiras?
MORASCO – No mercado há de tudo, bons e maus equipamentos.
CRISTOFANI – Há máquinas muito boas, mas não saberia dizer se estão atendendo às novas normas.
MARCELO LIMA – O principal problema com relação a equipamentos importados é a falta de peças. Há muitos importadores, mas não há a preocupação de oferecer peças para a reposição imediata.

E não é possível adaptar peças nacionais a esses equipamentos?
ALVES – É possível adaptar a parte elétrica e o acabamento, por exemplo. Mas algumas peças não.
LIMA – No começo, propúnhamos adequar elevadores chineses, pois já conhecíamos os problemas desses equipamentos. Mas essas alterações não são possíveis dentro da obra, cabe ressaltar.

Em 2010, algumas construtoras estavam considerando comprar equipamentos, pois os prazos de locação eram muito extensos. Como está o cenário hoje?
CRISTOFANI – Muitas empresas que só trabalhavam com gruas acabaram entrando no mercado de cremalheiras. Estamos conseguindo adquirir as máquinas em um prazo coerente, de dois a três meses.
JOSÉ ROBERTO LEITE – Em 2010, chegamos a estudar a possibilidade de comprá-los, mas isso não foi viável devido à necessidade de manutenção, armazenagem etc. Hoje, se as construtoras tiverem um bom planejamento, não sofrerão com a falta de equipamentos.

A partir de 2015 os elevadores terão que atender aos requisitos da NBR 16.200. Como isso vai impactar a oferta e a demanda de elevadores a cabo?
LIMA – O elevador a cabo não será proibido, cabe ressaltar. Mas esses elevadores serão tão diferentes com a norma, que praticamente se trata de outro produto, com custo de produção quase igual ao dos elevadores de cremalheira. Nós, por exemplo, não vamos mais fabricá-los. Sem contar que o seu uso terá limitação de altura.

E no caso dos cremalheiras, a nova norma vai afetar a produção?
LIMA – Todos os fabricantes já estão se ajustando aos novos parâmetros. A norma tem várias interpretações, o que dificulta o trabalho dos fabricantes. Estamos tentando equalizar essas questões.

Os construtores têm dimensionado corretamente os elevadores?
LEITE – Tivemos diversos problemas nesse sentido, mas conseguimos melhorar muito a nossa produtividade em obra com a identificação dos problemas e a aplicação de propostas para aumentar a eficiência do equipamento. Hoje, inclusive, investiríamos em máquinas com velocidade maior. Trabalhamos com equipamentos de 36 m/ min, mas chegamos a estudar a adoção de um equipamento que opera a 66 m/min. O ganho total com o aumento de produtividade, já descontando o valor desse investimento, seria de R$ 110 mil em uma obra de 25 andares.
FREIRE – Mas o uso de máquinas mais velozes, ressalto, compensa apenas em obras com alturas superiores a 100 m.
MORASCO – Na hora de dimensionar, minha maior crítica é que as construtoras sempre optam por um único equipamento, enquanto batemos o pé para termos pelo menos dois, que seria o ideal. É preciso saber se os funcionários serão ou não transportados no cremalheira. A prioridade das construtoras é transportar materiais. O cremalheira fica à disposição dos funcionários em horários e andares determinados. Essa prática tem sido adotada com frequência. Em obras maiores, com mais de 200 operários, é preciso equacionar essa necessidade. Alguns estudos apontam que a perda de produtividade da mão de obra acaba compensando o investimento em um elevador exclusivo para transporte de operários. Em momentos de pico, o elevador dimensionado para funcionários pode, inclusive, auxiliar no transporte de materiais.
FREIRE – Em Fortaleza, se usa muito o cremalheira de cabina dupla, o que representa um ganho grande de produtividade. O investimento inicial é maior, mas o ganho de desempenho também. Uma cabina é destinada ao transporte de materiais e a outra, de funcionários. Essa é a prática recorrente no mundo todo.
LIMA – Nossa orientação é que sempre se considere o uso de uma grua como complemento do cremalheira, pois ajustes e paradas para manutenção são sempre necessários. Outro ponto é que hoje o tempo de trabalho dos elevadores é muito maior do que há quatro anos. Hoje, todos os equipamentos trabalham de sábado, ou seja, o desgaste é muito maior.

Há uma queixa de que os cremalheiras mais rápidos não têm atingido a velocidade prometida. O problema está no equipamento?
LIMA – De fato, as velocidades ficam muito limitadas, pois os elevadores mais velozes possuem dois ou três motores mais pesados e não há energia suficiente no canteiro para fazêlos funcionar.
FREIRE – O uso de inversor de frequência confere uma performance melhor ao equipamento.

Como as construtoras podem resolver o problema de falta de energia nos canteiros, para não prejudicar a performance dos equipamentos?
LIMA – Geralmente com o uso de gerador.
ALVES – Mas o gerador não tem a mesma performance de rede que a instalação elétrica. E é importante lembrar que o gerador é o inimigo número um do inversor de frequência.

Qual é o modelo ideal de cremalheira para o perfil das obras e das redes elétricas brasileiras?
ALVES – O mercado nacional ainda está acomodando. Ainda estamos estudando o modelo ideal para cada perfil de obra e região.